Ela ali. Mão na bolsa. Cadê a chave? Cadê a droga da chave. Não podia entrar em casa sem ela. E tudo que era queria era entrar. Chuva caindo. Ensopada. As lagrimas secas. Dentro dela, inundações. Estava com ele, claro. Tinha que estar. E ela pensa em voltar. Mas não queria.
Sem retorno, claro. Mas como entrar então? Como recolher cacos espalhados pela sala? Arrebentar de vez as mãos nas paredes. Cabeças. Peito batendo. Rápido, rápido. Ninguém. Solidão e sem chaves.
Casa. Por que fora morar em uma casa? Mais fácil seria em um apartamento. Pediria ao porteiro: - Deixe-me entrar. Perdi-me lá dentro. E nada das chaves. Batons, retratos, carteira de identidade para saber quem era. No momento, nada.
Um carro, luz. Derruba tudo no tapete. Bem-vindo ao lar. Irônico. Escova de dente, pasta, um sabonete de motel. Fragmentos. As lágrimas chegam. Misturam com a chuva. Da casa ao lado cheiro de bolo. Saudades da mãe.
Ir para casa da mãe. Não pode. Ouvir o: "eu te avisei que não daria certo. Ele não presta”.
Maldita chave! Está com ele. Certeza. Fez de propósito, para que ela voltasse. Mas, nunca mais piso aqui. Última frase dita assim, com forças profundas. Senta no meio-fio.
– Que foi, nunca viu não? Menina de bicicleta. Vizinha. Passa correndo. Tudo espalhado. Espelhos, batons que nunca usara. Um chicle de menta. Pedaços de fotos. Dela. Passado. Dele.
Relembra caminhos. Estradas. Desertos sentimentos. Claro. Vislumbra o brilho das chaves sobre a escrivaninha. Dele. Voltar? Nunca, jamais. Sentada no meio-fio, pensa no ridículo da situação. A vida espalhada aos seus pés. O caminho sem volta. A porta trancada. E a chuva caindo docemente sobre seus cabelos. Ri. Gargalhada triste.
A menina da bicicleta corre para casa. - Mãe, a moça ai do lado enlouqueceu!
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