O menino se assustou com o barulho do carro, mais ainda quando sentiu a mão da mãe largar a sua. Virou confuso para trás e não entendeu a mãe caída no chão. Ficou olhando: prestando atenção no filete de sangue escorrendo do ouvido. O monte de gente parando em torno. A mãe, imóvel, quietinha. Segurou suas mãos, tão leve, tão fria. Achou que a mãe tinha frio, tirou o casaco e cobriu seus braços.
Gente chegava, parava, depois ia embora, fazendo o sinal da cruz. Alguns olhavam o menino, exclamavam: coitadinho! E se iam, apressados.
Um policial chegou, olhou a mulher, olhou o menino, pediu aos curiosos para se afastarem. Gritou por um médico. Alguém avisou que já haviam chamado uma ambulância.
- Licença, licença. – um homem empurrava a multidão. – Ô seu guarda, sou médico, posso ajudar?
- Acho que morreu.
- Posso verificar? – perguntou o homem, apontando a mulher caída no asfalto. O guarda concordou.
O médico abaixou e examinou a mulher. Sentiu pulso, tocou na pele da face. Fez tudo isso sob o olhar atento do menino.
- Morreu. – sentenciou, limpando as mãos. Depois, sumiu na multidão.
- Morreu... – sussurraram os curiosos, alguns já indo embora, perdido o interesse.
- Ai, cancela a ambulância e chama o rabecão. – pediu o policial, voltando a controlar o trafego.
A palavra morte não era muito compreensível para o menino: qualquer coisa como viajar. Mas, se ele podia ver a mãe, ela não tinha viajado. Poderia ser dormir, mas seus olhos estavam abertos. Sabia que o carro havia machucado a mãe, mas não entendia o porquê dela não chorar, (quando ele se machucava, costumava chorar tanto que um dia inundaria o mundo, dizia sua mãe).
Ficou lá, do lado da mãe, enxotando as moscas que insistiam em pousar nos seus lábios. Sentia uma coisa esquisita dentro do peito. Seu coração de menino não sabia explicar o nó da garganta. Botou a cabeça da mãe no seu colo, fez um carinho em seus cabelos encharcados de sangue, e tentou acordá-la com um beijo.
Escrito em janeiro de 1995
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